segunda-feira, 16 de junho de 2014

O TEATRO DE BONECOS NA EDUCAÇÃO: Um método eficaz e criativo para trabalhar conteúdos na sala de aula.


Texto: Dario Junior
     
      Foto 1- bonecos construídos em oficina ministrada por mim, juntamente com a professora Eliete, dentro do Curso de Capacitação de Professores Alfabetizadores e Pré-escolar, realizado pela UFPB em 1995.

O Teatro de Bonecos em muito tem contribuído para uma retomada do ensino em todas as séries do ensino fundamental e médio. Na minha experiência como arte-educador, tenho percebido um interesse crescente dos jovens especificamente com o boneco e as técnicas de manipulação que utilizo em três modalidades de boneco: BONECO DE VARA, BONECO DE LUVA e BONECO DE SOMBRA. Todas essas modalidades de bonecos utilizam material de sucata em sua construção: desde garrafas pets de refrigerantes, até recipientes de shampoos vazios, caixas e embalagens usadas, tampas de plástico, jornais velhos, cabos de vassoura, tecidos usados e uma série de outros materiais que iriam parar no lixo, são todos reaproveitados dentro da nossa oficina. Um outro fator importante da utilização do boneco é a perspectiva grupal que ele projeta nos trabalhos com crianças, jovens e até adultos. 

Normalmente as apresentações do teatro de bonecos exigem um trabalho em grupo. Desde a escolha do texto, leituras, construção dos personagens, ensaios, confecção dos bonecos, cenários e por fim a apresentação. Todo o processo de trabalho exige uma aproximação entre os participantes, tanto na confecção como na leitura, interpretação e apresentação, todos devem comungar um mesmo sentimento de integração e responsabilidade, como acontece no teatro com pessoas, a sequência e o aprendizado são  os  mesmos e os resultados educativos também, mudando apenas em alguns aspectos metodológicos e na utilização do boneco como ator.

     Foto 2- bonecos construídos em oficina ministrada por mim, juntamente com a professora Eliete, dentro do Curso de Capacitação de Professores Alfabetizadores e Pré-escolar, realizado pela UFPB em 1995.

Os bonecos da (Foto 1 e 2), foram confeccionados numa oficina ministrada por mim, Dario Junior e Eliete Matias, dentro do Curso de Capacitação de Professores Alfabetizadores e Pré Escolar dos Municípios de Pitimbú, Desterro, Cuitegi, Pilões e Itaporanga, na Paraíba, realizado pela UFPB em 1995, que incluía professores de várias escolas. Nesse trabalho foi possível incluir várias etapas da construção do boneco até a apresentação dos grupos, que aconteceu no Teatro Lima Penante em João Pessoa e foi bastante elogiado por todos que participaram. Os bonecos da Foto 1, seguiram a temática do Boi de Reis, que uma das participantes lembrava haver assistido em sua cidade quando era jovem. Segundo ela, o grupo de Boi de Reis de sua cidade, não mais existia e ela tinha muitas saudades. A confecção dos bonecos como galantes, damas e mestre demonstrou a destreza que tinham com a costura e os detalhes, bem como uma boa memória das vestimentas e passos, que foram exaustivamente ensaiados e deram um show na apresentação final, quando todos subiram no palco e dançaram junto com os bonecos por cerca de meia hora! Observem que entre os bonecos da foto 2, existem bonecos com vogais desenhadas e coladas com material próprio do tecido. Esses bonecos, vogal u, e, a, fizeram parte do trabalho de um grupo de professores que utilizou as vogais como tema e que foi muito bem elaborado e aplaudido por todos, tendo inclusive uma música minha sobre as vogais, como trilha sonora da apresentação! 

      Foto 3- oficina com os professores de escolas do interior paraibano no Teatro Lima  Penante- NTU-UFPB, 1995. No canto direito, meu filho sorrindo para a foto!

Na (Foto 3) é possível ver toda a produção de bonecos confeccionados na oficina com os professores. Cada grupo de 5 bonecos faz parte de um grupo de 5 professores que escolheram um tema à partir de uma música minha, confeccionaram o texto com personagens e diálogos e montaram o teatro para apresentação.

É de suma importância considerar que o teatro de bonecos será o mais eficaz método de ensino num futuro bem próximo! Com o boneco nas mãos o Professor poderá alfabetizar, contar estórias, dar aulas de geografia, ciências, história, matemática, utilizando qualquer uma das técnicas citadas acima. A minha experiência tem me dado suporte para afirmar com certeza que o boneco ensina de uma forma diferente e essa diferença está na maneira lúdica e jocosa com que ele se comporta. Seus trejeitos e vozes engraçadas, criam no jovem um interesse apaixonante e muitas das vezes participativo, ou para ser mais modernoINTERATIVO. Com o boneco nas mãos o jovem passa a manipular e improvisar em cima do tema proposto pelo professor, ampliando o seu entendimento sobre o texto e valorizando a criatividade no ato de aprender. 

      Foto 4: Oficina com meninos da Granja do Costa e Silva em 1993- (FUNDAC )

Desenvolvi em 1993, na Granja do Costa e Silva (núcleo da FUNDAC), bairro de João Pessoa, uma oficina que durou cerca de um ano e meio, (Foto 4), com jovens da periferia que estavam inseridos num grupo de risco, sendo moradores de um local altamente violento e com um índice de criminalidade assustador, na época. Foi um trabalho difícil, mas como todo trabalho educativo, gratificante e que rendeu frutos de várias apresentações pela cidade, valorizando o trabalho dos meninos e ao mesmo tempo ensinando e educando para vida. Neste mesmo período foi possível realizar um projeto amplo, com oficina de confecção de bonecos, de leitura de texto, exercícios teatrais para provocar uma maior aproximação entre os meninos, bem como, a fase da montagem do espetáculo. Entre os vários objetivos da oficina de teatro de bonecos eu destaco:

. Despertar a criatividade
. Ampliar a imaginação
. Aperfeiçoar a concentração
. Trabalhar a timidez
. Exercitar a voz e entonações
. Valorizar o trabalho em grupo
. Desenvolver a coordenação motora
. Valorizar a utilização de materiais de sucata
. Despertar o interesse pela leitura


     Foto 5- oficina com jovens da favela São Rafael, que "frequentavam" a UFPB nos horários de almoço.

Encontrei esses meninos da (Foto 5), pedindo restos de almoço aos frequentadores do restaurante universitário da UFPB. Eram todos provindos da Favela São Rafael, que fica próximo a UFPB, e concentra um número muito grande de moradores e residências, numa  faixa longa, beirando o rio Jaguaribe e que se estende seguindo ao lado da rodovia, BR 230.

Com esses garotos eu desenvolvi uma oficina de bonecos e outras atividades por quase dois anos, num setor de reciclagem de papel que ficava próximo a Reitoria da UFPB. Percebi o quanto o boneco atraia a atenção dos garotos e conseguia entretê-los, sempre que começavam a manipulá-lo. O extenso período que passei com eles foi muito importante em suas vidas. Hoje encontro com vários deles, já adultos e muitos casados, trabalhando em supermercados, guardando carros na feira, vendendo frutas e verduras e que ao me verem se lembram do período das oficinas de bonecos que tivemos quando eram garotos. Ficamos a conversar, e eles demonstram um grande carinho com aquele momento das suas vidas, quando o boneco esteve sempre como um dos seus melhores companheiros nas brincadeiras e no aprendizado que se dispuseram compartilhar comigo.


             Foto 6- Alunos em oficina de confecção de bonecos, no bairro dos Bancários- PB.

Essa Oficina (Foto 6), foi desenvolvida com jovens estudantes e moradores do bairro dos bancários , João Pessoa-PB-Brasil, juntamente com pais e professores. Os participantes da oficina, eram em sua maioria  estudantes de escolas particulares localizadas no próprio bairro e produziram igualmente aos outros grupos já citados, excelentes trabalhos nas finalizações da oficina. 

     Foto 7 - Alunos do Projeto de Extensão Cultural Catarina da COEX/PRAC/UFPB, no Município de Cabedelo-PB.

No Município de Cabedelo, em João Pessoa-PB-Brasil, desenvolvi uma Oficina de Teatro de Bonecos (Foto 7), com construção e montagem de espetáculos e com duração de seis meses, pelo Projeto de Extensão Cultural Catarina da Coordenação de Extensão Cultural da UFPB, com sede na Fortaleza de Santa Catarina, ainda hoje.

Com os meninos, oriundos de bairros periféricos e carentes da cidade, pude perceber um grande interesse pelo boneco e muitos deles faziam um longo percurso até a Fortaleza, para realização da Oficina. Interessante foi perceber que no decorrer dos trabalhos, foram sendo construidos pelos garotos, personagens de marinheiros e capitães, influência do porto de Cabedelo que fica muito próximo da cidade e é responsável pelo turismo permanente de marinheiros e tripulantes vindos de várias partes do mundo nos navios e fragatas que lá aportam com mercadorias variadas.

O Porto ainda é um referencial importante para os habitantes e os meninos demostraram isso através das montagens dos trabalhos e das apresentações do teatro, com personagens falando de marinheiros heróis e suas viagens pelo  mundo, em embarcações e barcos de pesca, outro referencial importante, já que grande parte dos habitantes vivem da pesca marinha.


              Foto 8 - com bonecos do Acervo do NUPPO (Núcleo de Cultura Popular da UFPB)

Recentemente, estive visitando o NUPPO (Núcleo de Pesquisa e Documentação da Cultura Popular da UFPB) e fiz várias fotos com bonecos do acervo em exposição, (Foto 8). Pude perceber a beleza dos bonecos e suas características rudes, feitos em madeira, mas trazendo formas equilibradas e bem desenhadas, com pintura marcante e aplicada de forma simples, normalmente utilizando o preto para facilitar os contornos e a figura dos bonecos. Os cabelos sao pintados de preto na própria cabeça de madeira, facilitando a construção e finalização do boneco e produzindo um efeito plástico muito interessante.

Essa visita me fez lembrar dos anos de convivencia com o Mestre Joaquim do Babau, morador do Bairro dos Novais em João Pessoa-PB e suas "brincadeiras" com os bonecos que ele mesmo construia. Tive a honra de vê-lo em ação apresentando seus bonecos, com muita graça e encanto. Escondidinho dentro da tenda, observava tudo que acontecia lá fora por um buraquinho minúsculo  no tecido para poder soltar  brincadeiras com  os presentes, falando da cor das suas camisas, tamanho dos cabelos, se estavam calados ou surpresos com seus bonecos e muitas outras formas de dialogar com os especatadores do seu teatro, deixando todos de boca aberta a se perguntar: mas como o boneco sabe de tudo isso? será que ele é de verdade mesmo? Claro que os de mais idade é que ficavam se perguntando da veracidade do boneco, porque os pequenininhos, já estavam mergulhados na fantasia!


BREVE HISTÓRICO DO TEATRO DE BONECOS

Surgido nos primórdios da civilização, executado através da utilização de sombras nas paredes das cavernas pelos primitivos habitantes do nosso planeta, o teatro de bonecos vem resistindo por séculos e séculos, apresentando-se sempre como um excelente estimulador cultural de gerações de crianças e jovens, bem como adultos que dedicam toda sua vida realizando atividades em prol da preservação cultural do boneco em todas as suas formas. 

Segundo Idalina Ladeira, 

Na América, os fantoches foram trazidos pelos colonizadores. Entretanto os nativos já confeccionavam bonecos articulados, que imitavam movimentos de homens e animais. Depois da primeira guerra, as marionetes, bonecos articulados movidos por fios, foram difundidas pelo mundo e introduzidas nas escolas, principalmente na Checoslováquia e nos Estados Unidos.

Ainda na pré-história , as mães teriam desenvolvido o teatro  de dedos, projetando, com as mãos, sombras diversas nas paredes para distrair os filhos. Com o passar do tempo, os homens começaram a modelar bonecos de barro, sem movimentos, a princípio. Mais tarde, conseguiram articular a cabeça e os membros dos bonecos para, a seguir, fazer representações com eles. Na Índia, China e Java também eram realizados teatros de bonecos. Os egípcios encenavam espetáculos sagrados nos quais a divindade falava e era representada por uma figura articulada. Na Grécia Antiga, os bonecos articulados tinham além da importância cultural, conotações religiosas. O Império Romano assimilou da cultura grega o teatro de bonecos, que rapidamente se espalhou pela Europa.


No Brasil, os bonecos começaram a ser utilizados em representações, no século XVI. No tempo dos vice-reis eram muito apreciados. Foi no Nordeste que o teatro de bonecos apareceu com destaque, principalmente em Pernambuco, onde até hoje é tradição. É o teatro mamulengo, rico em situações cômicas e satíricas. Há muito tempo grupos vem se esforçando para desenvolver o teatro de bonecos no Brasil. Mas só a partir de meados deste século os resultados começaram a aparecer. Nestes últimos anos, o teatro de bonecos tomou grande impulso em nosso país com o aperfeiçoamento da atuação dos grupos, apresentando um excelente trabalho.

Fotos: Dario Junior, Eliete Matias e Fabiano Ferreira

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